terça-feira, 7 de março de 2017

Malungo==Irmãos de Barco - Carrancas de Mestre Orlando e Paulo Nazareth.



Baseada numa busca-promessa, essa exposição é um experimento sensível de múltiplas relações possíveis entre arte contemporânea e arte popular, concretizadas pelo diálogo entre as obras de dois artistas: Mestre Orlando Santos Ferreira e Paulo Nazareth.

Paulo foi aluno de mestre Orlando em Belo Horizonte nos anos 1990. Hoje artista reconhecido internacionalmente nunca apagou do currículo o nome do mestre com quem aprendeu o entalhe em madeira e os princípios da arte de conduta. Mestre Orlando, baiano radicado nas terras mineiras em 1969, dedicava-se à escultura de carrancas, atendendo a crianças e jovens em projetos sociais e centros culturais distantes do centro da cidade, das instituições de arte, do mercado da cultura e do que seriam padrões estéticos canônicos. A partir da obra de Paulo, cujas fotos, gravuras, panfletos, vídeos e objetos podem ser pensadas a partir da arte carranqueira, a exposição buscará ativar uma parte do acervo de obras de Mestre Orlando, hoje sob a guarda de sua família.

A carranca sintetiza dois vetores nesse diálogo ficcional: por um lado, esse espírito guardião que cria a ambiência para a boa navegabilidade no devir-barco, por outro, os fortes contornos de lutas sociais e resistências políticas. Carrancas a “espantar” os “maus espíritos”  de injustiças, apagamentos, emoções mal-ditas, não-ditas. Com inspiração nessa arte popular “do contra”, obra e vida de Mestre Orlando e Paulo Nazareth são carrancas contra o Estado, contra o mercado, contra o pensamento unívoco, contra o preconceito instituído e os imaginários viciados, contra o imperativo da regra cega que desliza em águas perigosas. É essa travessia que os fez e faz Malungo == Irmãos de Barco.

Tanto no gesto expográfico quanto na invenção de formas de ocupação do espaço expositivo, avessa aos modelos convencionados, a exposição busca sublinhar a importância da conexão entre pensar-sentir-fazer, fundamental nos chamados conhecimentos tradicionais, na constituição dos processos de ensino-aprendizagem e da criação em artes visuais. Nesse sentido, os acervos se desdobram em acontecimentos e ações em progresso, como um Ateliê Aberto capitaneado pela família de Mestre Orlando e uma caminhada-performance de Paulo Nazareth da nascente à foz do Rio São Francisco.

Luciana de Oliveira
Curadora


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